Com medo do coronavírus, pacientes adiam a busca por atendimento
17/04/2020

Enquanto a Covid-19 se alastra, doenças crônicas e outras emergências não deixam de existir. Mas buscar atendimento nesses casos tem se tornado a última opção diante do medo de se contaminar.
Breno Monteiro, presidente da Confederação Nacional de Saúde, que representa hospitais, clínicas e laboratórios, estima que a taxa média de ocupação nas unidades privadas no país, entre leitos clínicos e UTIs, é de 40% a 50%. Já os laboratórios estão com até 80% da capacidade ociosa:
— A base do sistema é o médico, e muitos consultórios não estão funcionando. O que resta aberto, então, é o pronto-socorro. Mas as pessoas estão com medo de ir lá. Os pré-natais, o controle de doenças cardíacas e renais, da diabetes... Nada está sendo feito como deveria. Uma dor precordial, que seria um sinal de infarto, levaria a pessoa direto ao hospital, mas hoje a tendência é postergar. E isso pode resultar numa evolução muito ruim.
O cenário apontado por médicos é confirmado nos registros de atendimento em emergências e de internação hospitalar na rede privada. No Copa D’Or, na Zona Sul do Rio, houve uma redução de mais da metade de atendimentos diários na emergência.
Segundo o diretor médico da unidade, Marcelo London, a emergência principal costumava atender cerca de 300 pessoas por dia. Hoje, o número não passa de 120. Já a ala separada para pacientes com sintomas respiratórios, de gripe, recebe entre 60 e 70.
Ele reforça que os pacientes com suspeita de coronavírus são totalmente isolados e, que, por isso, não se deve temer buscar atendimento quando necessário. A triagem da emergência foi antecipada: um profissional pergunta os sintomas e direciona o paciente já na porta. Os que têm tosse, febre ou garganta inflamada são atendidos por especialistas com EPIs e recebem máscaras.
London diz que os cerca de 700 médicos do hospital repassam a mensagem para seus pacientes de que tratamentos de doenças crônicas, acompanhamentos para cirurgia futura ou emergências não podem ser negligenciados.
Os leitos de terapia intensiva estão ocupados, em grande maioria, por pacientes com Covid-19. Havia muita admissão de pacientes que vinham com diagnósticos de septicemia de origem pulmonar, infecção urinária e cálculo renal. Mas essas pessoas não aparecem mais — diz London.
Isso não significa, obviamente, que as doenças tenham sumido. London cita o caso recente de um paciente com apendicite aguda, com perfuração. Estava com medo de se tratar no hospital. O desfecho de doentes atendidos em estado crítico costuma ser mais complicado.
Casos aparentemente mais brandos também preocupam. A aposentada Helena de Freitas, de 69 anos, moradora de Copacabana, quebrou o pé há dois meses. Foi ao Hospital São Lucas, em seu bairro, e saiu de lá com uma bota que deveria ser retirada em um mês. Com a pandemia, preferiu seguir com a imobilização:
Antes as dores que sinto do que pegar coronavírus.
Daniel Coudry, CEO da Amil, conta que houve queda significativa nas 58 unidades próprias da operadora em que é feito o atendimento primário. Parte da mão de obra que está ociosa será remanejada para trabalhar no novo serviço de telemedicina que será lançado hoje pela operadora.
— A proposta é abrir um canal para que a população não fique sem assistência. E iremos identificar casos de pacientes que precisam ser encaminhados para atendimento presencial — afirma Coudry.
(Colaboraram Maiá Menezes e Patrícia Espinoza Paiva)
Fonte: O Globo