top of page

Cursos de medicina têm até dia 31 para adequar estágio ao Mais Médicos

06/12/2018
IMAGEM 6.jpg

Os cursos de medicina no Brasil ainda não se adequaram às novas regras propostas pelo Programa Mais Médicos. O objetivo delas é formar profissionais mais preparados para a atenção básica em saúde, área afetada com a crise da saída dos médicos cubanos do Brasil. As mudanças curriculares foram aprovadas há quatro anos e precisam ser aplicadas em 332 cursos em atividade até 31 de dezembro deste ano.

 

Entretanto, especialistas ouvidos pelo G1 dizem que elas não saíram totalmente do papel por causa da burocracia, da resistência de professores e da falta de docentes qualificados na área. As novas diretrizes foram aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) e homologadas pelo Ministério da Educação: uma das principais é obrigatoriedade do estágio de 760 horas na atenção básica de saúde.

 

Ideia inicial descartada

 

Em 2013, a ideia original do governo federal era ampliar de seis anos para oito anos a duração do curso. Os dois anos extras seriam destinados a um estágio obrigatório na atenção básica: em postos de saúde, e nos demais programas na área, como as visitas domiciliares. A medida, porém, teve repercussão negativa entre as faculdades e o MEC desistiu da proposta ainda em julho.

 

Com a promulgação da Lei do Mais Médicos, o Conselho Nacional de Educação (CNE) reformulou as diretrizes nacionais para os cursos de medicina.

 

Duas alterações importantes foram feitas:

 

Metodologia de ensino: incentivo à tendência de integrar disciplinas e apresentar aos estudantes uma visão global do paciente.

 

Mudanças no internato: 30% do internato, ou cerca de 760 horas, passam a ser destinados à prática nas áreas de atenção básica, de serviços de urgência e emergência e de atendimento em saúde mental no SUS.

 

Os demais 70% do internato, que somam aproximadamente 1.760 horas, são destinados ao estágio nas áreas de clínica médica, cirurgia, ginecologia-obstetrícia, pediatria, saúde coletiva e saúde mental, que também podem ser cumpridas no SUS. Não existe carga horária mínima para essas áreas, mas o estágio em cada uma não pode passar de 20% da carga horária total do internato.

 

Prazo para cumprir a regra

 

Mas Cármino Souza, presidente do Conselho de Secretários Municipais de Saúde do Estado de São Paulo (Cosems-SP), diz que é possível considerar a meta do internato parcialmente cumprida. “Algumas escolas [de medicina] fizeram, outras não.”

 

Nildo Alves Batista, que desde novembro preside a Associação Brasileira de Educação Médica (Abem), afirma que o maior desafio é a adequação da infraestrutura e da logística das faculdades, e que a regra é positiva.

 

“Mas as escolas já estão todas prontas e fazendo? Não, elas vêm procurando ainda mecanismos para se adequar às diretrizes”, disse ele, que também é professor titular da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

 

Punição em caso de descumprimento

 

Os dois órgãos do governo federal responsáveis pela fiscalização do cumprimento da lei pelos cursos e universidades são o Ministério da Educação e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).

 

A partir de 2019, a exigência de carga horária no internato passará a ser condição para que o curso receba a renovação de reconhecimento.

 

Em nota, o MEC afirmou ao G1 que, caso a regra seja descumprida, o curso poderá aderir a um “protocolo de comprometimento” e ganhar novo prazo para implementar as mudanças. Caso o novo prazo não seja seguido, a faculdade pode ser punida com medidas cautelares, como a proibição de abertura de novos vestibulares, ou até a desativação do curso.

 

Tirar o estudante do hospital

 

Segundo Batista, o objetivo da mudança é obrigar as faculdades a formarem seus estudantes também nos serviços fora do hospital.

 

“Essas diretrizes vieram para dizer que precisa formar o médico fora do hospital, na UBS, na AMA, e na comunidade. Tem serviço que vai no domicílio, faz essa procura mais ativa.” – Nildo Alves Batista, presidente da Abem

 

Cármino Souza, do Cosems-SP, dá aulas há 40 anos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e explica que os currículos precisam passar por uma revisão para incluir os estudantes em atividades de formação em saúde desde o primeiro ano, em vez de focar apenas em uma carga horária pesada de conteúdos teóricos.

 

O papel dos professores

 

Ele também considera a preparação dos professores fundamental para cumprir as novas diretrizes, e que ela deve andar de mãos dadas com a expansão das vagas em medicina.

 

“Você precisa de gente que tenha formação generalista para ensinar medicina geral. Isso é outro desafio, não adianta abrir escola sem ter professor preparado.” – Cármino Souza, presidente do Cosems-SP

 

Mas, segundo Nildo Batista, da Abem, outro desafio que as diretrizes ainda precisam transpor é a resistência de alguns professores. “Como ele já trabalha no hospital, para ele é mais adequado ficar dentro do hospital.”

 

‘Mudar o curso do navio’

 

Os novos cursos autorizados desde o início do Mais Médicos já devem seguir as novas regras, mas os mais antigos, inclusive os centenários, levam mais tempo para se adequar.

 

Fundada há 107 anos como Faculdade de Medicina de Belo Horizonte, a escola que hoje integra a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) fomou sua primeira turma de médicos em março de 1918 e chegou a ter nomes ilustres como parte de seus estudantes, incluindo o escritor João Guimarães Rosa, que foi orador da turma de 1930, segundo o Centro de Memória da FM.

 

Há 40 anos, em 1978, a UFMG se tornou a primeira universidade do Brasil a instituir o internato rural, onde os estudantes fazem o estágio em municípios fora da zona urbana e trabalham exclusivamente na atenção básica de saúde.

 

Mesmo assim, foi só em 2016 que a faculdade contratou pela primeira vez um professor com título em medicina de família e comunidade: Nathan Mendes. “O navio é grande. Pra mudar a direção dele, haja força”, resume ele.

 

Formado em medicina pela UFMG, com mestrado em atenção básica em Cuba e doutorado em conclusão no Canadá, Mendes dá aulas no Departamento de Clínica Médica, que, antes dele, só aceitava docentes com residência específica na área de clínica geral.

 

Depois que as novas diretrizes curriculares fortaleceram um debate interno na faculdade sobre a importância de professores especializados na área não só para melhorar a formação dos estudantes, mas também para inspirá-los a seguir uma carreira semelhante. Desde a contratação do professor, outros três médicos de família foram admitidos como professores na UFMG e, recentemente, eles conseguiram a aprovação para criarem um Departamento de Medicina de Família e Comunidade.

 

“Já foi aprovado na Congregação da Faculdade de Medicina – órgão máximo decisório – e agora estamos esperando abrir a liberação de vagas pelo MEC”, diz ele, explicando que será necessário contratar outros seis docentes para que o departamento saia do papel.

 

Fonte: G1

bottom of page