Sete Estados ainda têm alta probabilidade de ‘lockdown’, diz estudo
10/06/2020
Ao menos sete Estados brasileiros ainda convivem com elevado risco de ter de paralisar totalmente as atividades econômicas (“lockdown”) por causa do novo coronavírus, mostra um estudo da consultoria Bain & Company. A análise leva em conta o nível de utilização das unidades de terapia intensiva (UTIs) e a velocidade contágio da doença. São regiões do Norte (Pará e Amapá), Nordeste (Rio Grande do Norte, Ceará, Maranhão e Pernambuco) e Sudeste (Rio de Janeiro).
As áreas de maior risco têm em comum a alta densidade urbana, baixos indicadores sociais e uso intensivo de transporte público pela população, com destaque para as capitais Fortaleza, Belém e Rio de Janeiro. A doença deve se alastrar também para as regiões menos povoadas do país, embora em ritmo mais fraco.
“A densidade mais baixa das capitais do Sul e Centro-Oeste e das cidades do interior é um fator que contribui para um perfil de contaminação mais controlado”, diz o estudo. Ainda que nas regiões mais remotas a velocidade de contaminações pelo novo coronavírus seja mais lenta, o avanço da doença nestes locais configuraria uma segunda onda de surto de covid-19 no Brasil.
Nesta etapa, também entram as regiões mais densas que já convivem com medidas de isolamento social mais rígidas e têm grande chance de observar nova aceleração de casos à medida que as regras de quarentena sejam flexibilizadas. Em capitais como São Paulo, o comércio começa a abrir gradualmente.
“A nossa situação socioeconômica impactou muito mais na pandemia de covid-19 do que se imaginava no começo”, afirma Ricardo Gold, sócio da Bain & Company. Segundo ele, é possível estimar que, por causa do aumento duplo de casos em regiões mais e menos densas, a doença deve exigir um esforço significativo das políticas públicas por um período de seis a 12 meses. “Enquanto não existe vacina, vamos viver com algumas restrições, como uso de máscaras em ambientes públicos, algum distanciamento social, medição de temperatura e testes”, afirma.
Um dos motivos para que isso ocorra é que a chamada R0 - “reproduction rate” ou a velocidade de transmissão do novo coronavírus - ainda está mais elevada no Brasil do que os níveis já atingidos em nações europeias, por exemplo. Um dos motivos é a maior vulnerabilidade social da população, característica que se aplica a toda a América Latina.
Além disso, o Brasil é um dos países menos eficientes na testagem dos suspeitos de terem contraído a covid-19. São três exames a cada caso confirmado, bem abaixo do indicado, de ao menos mais de 10.
De 16 de fevereiro a 25 de abril, 65% dos hospitalizados por doença respiratória ainda estavam sob investigação para confirmar o diagnóstico de covid-19. Embora defasados, os números evidenciam o atraso nas informações que são base para a formulação de políticas de saúde.
“Temos um ‘gap’ enorme de testagem. Isso impede que a reabertura seja mais rápida e dificulta que o governo tenha uma visão mais clara de quando a situação tende a piorar”, afirma Gold. O número relativo de exames no Brasil é inferior ao das nações desenvolvidas, como Áustria (25 testes por caso confirmado), Alemanha (20) e Suíça (12) e também menor em relação a países de perfil semelhante, como Argentina (11) e Índia (22).
Também são apenas sete as unidades federativas em que o nível de testagem é considerado adequado, segundo o levantamento. São eles: Distrito Federal, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná e Tocantins. “Os testes apenas em casos graves não funcionam como medida preventiva [...], o que também representa um grande desafio para medidas de relaxamento no país sem novos surtos”, destaca o levantamento.
Ainda assim, Gold é menos pessimista sobre os desdobramentos da segunda fase de contaminações pelo novo coronavírus. Segundo ele, há hoje mais folga no sistema de saúde em algumas regiões, ao mesmo tempo em que a chamada “imunização de rebanho” deve contribuir para conter o surto de covid-19.
“Já vemos alguns efeitos positivos da imunização por exposição nas principais capitais do país. O fato de a primeira onda ter sido muito mais chocante de certa forma pode ajudar daqui para frente”, afirma Gold.
Segundo o levantamento, já existe algum alívio na pandemia nas regiões inicialmente mais afetadas. “O Estado do Amazonas parece ter superado a fase de crescimento acelerado, atingindo uma estagnação nos últimos 30 dias”, destaca o estudo. Em São Paulo, que ainda concentra a ocorrência de casos e em que o aumento das contaminações persiste, um alento aparece na capacidade do sistema de saúde, que dá sinais de estabilidade.
A mesma avaliação não é válida para a maioria dos Estados do Norte e Nordeste, onde há uma sobreposição de fatores críticos, como maior número de pessoas morando em cada residência, falta de saneamento básico, nível de ocupação de UTIs e baixo número de profissionais de saúde e de ventiladores disponíveis.
Fonte: Valor Econômico